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Meditação, ondas cerebrais e efeitos psicofisiológicos

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A prática regular do Tai Chi Chuang, do Chi Kung e da Meditação tem efeitos psicossomáticos positivos profundos. Diminuem os sintomas ligados ao stress e à ansiedade, com efeitos positivos de curta e longa duração nas funções cognitivas e afetivas, conduzindo progressivamente a um estado de equilíbrio e serenidade interior, que se reflecte na melhoria da sua relação consigo e com os outros. Deste modo, o microcosmos individual harmoniza-se gradualmente com o macrocosmos, restaurando essa ligação de naturalidade perdida.
Aquelas práticas constituem um processo de transformação, influenciando positivamente a nossa mente emocional, favorecendo uma respiração fácil e profunda, capacitando serenar e aclarar a mente,  e atingir um melhor estado de saúde, bem-estar e de percepção do Eu.
O cérebro mantém-se activo constantemente ao longo das 24h do dia, gerando actividade eléctrica. Os diferentes períodos de repouso e actividade produzem diferentes padrões de impulsos eléctricos que podem ser medidos, nomeadamente através do uso do Eletroencefalograma (EEG). As pesquisas com carácter científico sobre meditação são diversas e heterogéneas, o que torna difícil a comparação dos resultados. Têm sido investigadas as relações entre as práticas e o sistema biológico, fisiológico e psicológico do praticante. As relações neuronais têm sido estudadas através da medição da atividade cerebral, nomeadamente  relacionando com os registos de EEG, assim como a relação de vários processos cognitivos às frequências e mapas topográficos de EEG.
Estudos realizados com eletroencefalogramas (Malmivuo e Plansey, 1995) revelaram 4 diferentes grupos principais de ondas cerebrais no cérebro humano, umas mais lentas outras mais rápidas, cuja investigação mostrou haver uma associação com diferentes actividades humanas. Alguns autores têm dado destaque a uma quinta onda (Gama) ainda mais rápida, mas ainda existe incerteza onde é gerada e que actividades cerebrais essas oscilações reflectem. Assim, foram identificadas as seguintes ondas/actividade, as quais são o resultado de medição da sua frequência em ciclos por segundo (Hz) e o comportamento da onda:
Fonte: http://imotions.com/blog/eeg/
- Ondas Delta (0.5 a <4 Hz) detectadas em crianças, e em adultos em sono profundo, coma, ou em meditação profunda. As ondas delta estão presentes apenas durante o sono profundo não-REM, também conhecido como sono de ondas lentas. Quanto mais forte for o ritmo Delta, mais profundo o sono. Os processos de cura e regeneração são estimuladas nesse estado, e é por isso que o sono restaurador profundo é tão essencial para o processo de cura. Como o sono está associado à consolidação da memória, as frequências Delta desempenham um papel central na formação e organização interna da memória biográfica, bem como nas habilidades adquiridas e nas informações aprendidas. Wise (1995) encontrou associações com estados de empatia. Detectado em praticantes de Chi Kung (Tei et al., 2009), meditação Zen (Faber et al., 2008) e meditação Vipassana (Cahn et al. 2013). Grande amplitude de onda.
- Ondas Teta (4 a <8 Hz) detectadas em jovens e crianças, em adultos em sonolência e a dormir, assim  como em meditação profunda. Em estado de atividade normal a onda Teta é associada a estados de inspiração, intuição e criatividade (Laibow, 1999). Estas ondas ocorrem em grande frequência quando estamos a sonhar acordados e a fantasiar. É associada, também, a períodos de meditação e espiritualidade (Wise, 1995) e a “estados motivacionais positivos” (Norris & Currieiri,1999). Acredita-se que as oscilações Teta do hipocampo desempenham um papel na formação e recuperação da memória episódica e espacial (Wang, 2010).
- Ondas Alfa (8 a 13 Hz) detectada no estado de vigília e em relaxamento abolidindo a atenção sobre o exterior, e em alguns estados meditativos. Aumentam durante o relaxamento mental e físico com os olhos fechados, e reduzem-se ou desaparecem durante a atividade mental ou corporal com os olhos abertos. Relacionadas com o aumento da percepção e consciência interior. Alfa é o estado de repouso do cérebro na qual o presente e o agora podem ser percebidos. As ondas alfa auxiliam a coordenação mental geral, a calma, a atenção, a integração mente / corpo e a aprendizagem. Associada a estados de relaxamento, calma e sentimentos de bem-estar. Ligada ao processamento de informação, de visão e atenção (Uhlhaas, et al. 2008; Nenert e Viswanathan, 2012), assim como na quantidade de informação a recordar (Nenert e Viswanathan, 2012).
- Ondas Beta (> 13 Hz) detectada no estado de vigília, ligada à actividade emocional, intelectual ou motora intensa. É considerada uma onda de atividade rápida e associa-se a estados de alerta. São as ondas dominantes no estado normal da consciência quando a atenção é dirigidada para tarefas cognitivas e para o mundo exterior. Presente quando estamos atentos e envolvidos na resolução de problemas, julgamento, tomada de decisão ou atividade mental focada, integrando novas experiências, em alta ansiedade ou excitação. Torna-se mais forte à medida que planeamos ou executamos movimentos, particularmente quando se exige precisão e atenção concentrada. O processamento cerebral contínuo de alta frequência requer uma grande quantidade de energia. Pequena amplitude de onda.
Assim, quando estamos despertos e em actividade mental (Beta) o cérebro apresenta um grande processamento, a onda é de actividade rápida, com uma frequência de ciclos elevada mas apresentando baixa amplitude. Quando relaxados (Alfa), a frequência de ciclos diminui e a amplitude das ondas cerebrais aumenta. Nesta perspectiva, pode dizer-se que o grau de excitação e a actividade cerebral pode ser expresso pelo tipo de ondas cerebrais originadas e que são características dessa mesma actividade.
Em estado de excitação mental e emocional (Beta) as funções mentais são prejudicadas devido à sobrecarga dos circutos neuronais responsáveis pelas várias funções do organismo, a atenção reduz-se, assim como a capacidade de processar nova informação, o que resulta na menor criatividade e bem-estar geral.
Nas condições em que a mente não afecta significativamente os pensamentos, como no estado de sono,  a frequência dos ciclos é baixa e o cérebro obtém um forte aporte de nutrientes e oxigénio. Se considerarmos o conceitos da medicina tradicional chinesa, neste estado o cérebro terá um aporte significativo de Chi. Assim, em condições de calma há menos distorsão e perturbação do cérebro, ocorrendo uma reorganização e recuperação benéfica e desajável do organismo.
Quando estamos relaxados a mente fica mais clara, serena e pacífica, sendo capaz de desempenhar melhor as suas funções, apresentando mais criatividade e sendo capaz de absorver mais informação, resolver problemas e ser mais diponível para o novo.
Neste enquadramento, pode evidenciar-se a grande relevância da meditação no equilíbrio do ser humano, nomeadamente daquela que é regular e orientada. Neste estado, as ondas cerebrais situam-se entre Teta e Delta. Devido à serenidade e ao relaxamento interior proporcionado pela meditação, mantendo um estado consciente e de alerta, ocorrem benefícios psicofisiológicos profundos que não são alcançáveis nos outros estados, para além de  desenvolver-se uma grande sensibilidade e percepção interior e exterior. Em meditação profunda, que aparenta em termos vibratórios ao estado de sono profundo não-REM, a mente consciente mantém-se activa e presente, continuando disponível, mas numa atitude de observação não interveniente. Neste estado de calma e serenidade, logo que se alcance o estado Alfa e Teta, as condições para a recuperação fisiológica, o reequilíbrio emocional e psíquico são as mais favoráveis, explicando os efeitos positivos no sistema imunológico, na qualidade do sono, no bem-estar psicológico e  na saúde emocional e mental já comprovados pela ciência  em diferentes classes de sujeitos.
Outros aspectos benéficos relacionam-se com uma atitude mental de consciência "não-ruminativa" e um estado de maior liberdade psicológica, para além de outros que podem ser consultados na literatura científica.
Outros estados de consciência, não confirmados pela ciência, são referidos pelas tradições ligadas ao Taoísmo, Budismo e Hinduísmo, nomeadamente a consciência universal, a iluminação e não-dualidade.
Para além dos efeitos funcionais da meditação foram observados efeitos estruturais, com alteração da plasticidade cerebral, nomeadamente na espessura do córtex que foi superior em praticantes regulares de meditação (Lazar et al., 2005).
A meditação e outras técnicas orientais de relaxamento têm vindo a ser utilizadas em sistemas de saúde de alguns países, como Nova Zelândia (Duke, 2005), Canadá (Andrewsa e Boonb, 2005), Austrália (McCabe, 2005), Reino Unido (Ernst, Schmid e Wider, 2005) e Estados Unidos (Spiegel, et al., 1998), sob a designação de medicina complementar alternativa (CAM).
Bibliografia:
Andrewsa, G. J.; Boonb, H. (2005). CAM in Canada: Places, practices, research. Complementary Therapies in Clinical Practice, 11: 21-27.
Cahn, B. R.; Delorme, A.; Polich, J. (2013). Event-related delta, theta, alpha  and  gamma  correlates  to  auditory oddball processing during Vipassana meditation. Social Cognitive and Affective Neuroscience, 8(1): 100-111.
Dr. Yang, Jwing-Ming (2003). La respiración embriónica. Meditacion Qigong. Editorial Sírio, S.A.
Duke, K. (2005). A century of CAM in New Zealand: A struggle for recognition. Complementary Therapies in Clinical Practice, 11: 11-16.
Ernst, E.; Schmidt, K.; & Wider; B. (2005). CAM research in Britain: The last 10 years. Complementary Therapies in Clinical Practice, 11: 17-20.
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Malmivuo, J.; Plansey, Robert (1995). Bioelectromagnetism -Principles and Applications of Bioelectric and Biomagnetic Fields.Oxford University Press, New York.
McCabe, P. (2005). Complementary and alternative medicine in Australia: A contemporary overview. Complementary Therapies in Clinical Practice, 11: 28-31.
Menezes, C.B.; Dell’Aglio, D.D. (2009).  Os Efeitos da Meditação à Luz da Investigação Científica em Psicologia: Revisão de Literatura. Psicologia, Ciência e Profissão, 29(2): 276-289.
Nenert, R., Viswanathan, S.; Dubuc, D.M., Visscher, K.M. (2012). Modulations of ongoing alpha oscillations predict successful short-term visual memory encoding. Frontiers inHuman Neuroscience, 6: 127.
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Tei, S.; Faber, P.  L.; Lehmann,  D.;  Tsujiuchi,  T.;  Kumano,  H.;  Pascual-Marqui,  R.  D.; Kochi, K. (2009). Meditators and non-meditators:  EEG source imaging  during  resting. Brain Topography, 22:  158-165.
Uhlhaas, P.J.; Haenschel, C., Nikolić, D.; Singer, W. (2008). The Role of Oscillations and Synchrony in Cortical Networks and Their Putative Relevance for the Pathophysiology of Schizophrenia. Schizophrenia Bulletin, 34(5): 927-943.
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[Luís Souto, 2019]
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